domingo, junho 11, 2006

A linguagem das flores


(Pierre-Auguste Renoir)


«Antigamente as flores tinham, entre os seus numerosos encantos, a tarefa de transmitirem subtis mensagens amorosas, mas na pressa do século vinte esta arte transformou-se numa linguagem morta. Não penso que convenha ressuscitá-la. É como o sânscrito, não há com quem o falar. (...)

«[E]ra possível [em Inglaterra, nas décadas que se seguiram a 1718] manter uma longa correspondência sem uma única palavra escrita usando diversas combinações num ramo. As damas punham grande cuidado na escolha do papel para os seus cartões, porque até as flores pintadas podiam conter outras intenções. Um lenço bordado com amores-perfeitos era uma indicação de que ela nunca esqueceria o seu apaixonado, com rosas, uma promessa de amor. Se a agulha criava com mestria a flor do marmeleiro, o destinatário podia considerar-se afortunado, porque indicava fidelidade total para o resto da vida. Chegou-se ao ponto de a orientação do laço num ramo determinar se os sentimentos se referiam ao doador ou ao receptor; a mão com a qual se apresentava ou aceitava a oferta mudava o desígnio, assim como o lugar do corpo escolhido pela mulher para as ter: quanto mais perto do coração, mais receptividade ao amor. Daí vem a tradição de oferecer orquídeas antes de uma festa; a dama escolhe o lugar onde prendê-la, na anca, na cintura, no cabelo ou no peito. É um costume abominável: não há vestido que fique bem com esse espantalho em cima. (...) Umas noções básicas são suficientes: o vermelho anuncia paixão, o branco pureza, o cor-de-rosa ternura, o amarelo esquecimento, o roxo modéstia (mas agora também é a cor das feministas). (...)

«Segundo a linguagem clássica das flores, o miosótis significa amor verdadeiro e recordação. Uma lenda austríaca diz que dois namorados caminhavam ao longo do Danúbio quando a jovem (caprichosa, evidentemente) viu uma pequena flor azul a flutuar na água e quis tê-la imediatamente. O jovem lançou-se ao rio para a apanhar, mas foi levado pela corrente e começou a afogar-se. Com as suas últimas forças alcançou a flor e atirou-a à namorada dizendo-lhe "não me esqueças".»

(Isabel Allende, Afrodite)

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