Pesagem das rações e conferência de informação
A 8 de Maio, a ração individual foi de quarenta e cinco gramas de carne de porco, uma colher, das de chá, de rum, trinta gramas de pão e um quarto de litro de leite de coco. O rum, embora servido com tanta parcimónia, prestava serviços incalculáveis.
Os homens passaram a tarde a fazer uma limpeza geral na chalupa, a secar e a arrumar as suas coisas. «Até aqui - conta Bligh - distribuí as rações a olho, mas hoje construí uma balança com as duas metades de um coco. Tendo descoberto, por acaso, algumas balas no fundo da chalupa, calculei, pelo seu calibre, que seriam precisas vinte e cinco para pesar uma libra inglesa, o que significava que o seu peso por unidade era de dezoito gramas. Decidi adoptar esses dezoito gramas para cada ração de pão que se distribuísse. Em seguida, fiz uma espécie de conferência acerca do que sabia da Nova Guiné e da Nova Holanda e informei-os da sua situação neste oceano tão pouco frequentado pelos navegadores. Dei-lhes essas informações para, no caso de me acontecer alguma infelicidade, os sobreviventes terem ideia da sua rota e serem capazes de demandar Timor. De Timor, alguns nem o nome conheciam. À noite distribuí-lhes dezoito gramas de pão e quinze centilitros de água para jantar.»
A 9 de Maio, o pequeno almoço constou de quinze centilitros de leite de coco e de algumas migalhas de pão estragado. Ao almoço, deu-lhes o miolo de quatro cocos e o resto do pão molhado, que, afirma, só seres humanos esfaimados seriam capazes de comer.
Nova tempestade se levantou, desta vez com trovoada e relâmpagos. Proporcionou-lhes nova provisão de água.
«Na miséria em que nos encontrávamos, devido ao frio e à humidade, distribuí a cada um uma colher, das de chá, com rum, pois de outro modo ninguém suportaria tão pavorosa situação.» O mau tempo aumentou, com fortes rajadas de vento, e passámos a noite em claro, sob grandes bátegas de água.
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
sexta-feira, junho 30, 2006
quinta-feira, junho 29, 2006
Uma viagem providencial (V)
Ao largo das ilhas Fidji
No decorrer do dia 7 passaram por algumas ilhas rochosas, donde viram sair duas grandes pirogas à vela que se lançaram em sua perseguição, mas que não tardaram a desistir. Pareciam construídas do mesmo modo que as do arquipélago dos Amigos, e Bligh supôs, com razão, que as terras que avistavam pertenciam ao arquipélago das Fidji. Mas, sempre entorpecido pela humidade, regista: «É com a maior dificuldade que consigo abrir um caderno para escrever, e lamento sinceramente não poder fazer mais do que assinalar a posição destas ilhas e dar ideia aproximada da sua extensão.»
De tarde começou a chover com violência. Todos se esforçaram então por recolher um pouco de água: atestaram os barris e encheram os quatro barrilitos pequenos e saciaram a sede pela primeira vez deste que tinham deixado a Bounty. Mas a chuva diluviana teve as suas desvantagens: encharcados até aos ossos e sem terem nada seco com que se cobrirem nem roupa para mudar, tremeram toda a noite, vítimas de arrepios de frio pavorosos.
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
No decorrer do dia 7 passaram por algumas ilhas rochosas, donde viram sair duas grandes pirogas à vela que se lançaram em sua perseguição, mas que não tardaram a desistir. Pareciam construídas do mesmo modo que as do arquipélago dos Amigos, e Bligh supôs, com razão, que as terras que avistavam pertenciam ao arquipélago das Fidji. Mas, sempre entorpecido pela humidade, regista: «É com a maior dificuldade que consigo abrir um caderno para escrever, e lamento sinceramente não poder fazer mais do que assinalar a posição destas ilhas e dar ideia aproximada da sua extensão.»
De tarde começou a chover com violência. Todos se esforçaram então por recolher um pouco de água: atestaram os barris e encheram os quatro barrilitos pequenos e saciaram a sede pela primeira vez deste que tinham deixado a Bounty. Mas a chuva diluviana teve as suas desvantagens: encharcados até aos ossos e sem terem nada seco com que se cobrirem nem roupa para mudar, tremeram toda a noite, vítimas de arrepios de frio pavorosos.
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
quarta-feira, junho 28, 2006
Uma viagem providencial (IV)
Aumenta a miséria dos homens da chalupa
Na noite de 4 para 5, a tempestade diminuiu de intensidade. Na manhã de 5, Bligh verificou o estado do pão: grande parte estava estragada e bolorenta, mas, em vez de deitá-lo fora, guardou-o cuidadosamente.
Embora a chalupa navegasse agora entre ilhas, a recordação do acolhimento dos indígenas de Tofoa era ainda demasiado viva para que tivessem vontade de aventurar-se em terra. A 6 viram ainda, de longe, algumas ilhas e, pela primeira vez, um peixe mordeu o anzol. Mas a sua alegria foi de pouca duração: "ficámos terrivelmente decepcionados - diz o comandante - porque o perdemos ao içá-lo para bordo." À noite, cada um recebeu para jantar trinta gramas de pão deteriorado e o seu sétimo de litro de água.
"Facilmente se imagina - observa o tenente Bligh - que lutámos com falta de espaço numa embarcação tão miserável." Tentou remediar a situação, estipulando que os homens descansassem por turnos: metade sentada e a outra metade estendida no fundo do barco. Mas apenas o céu os abrigava.
Bligh observa que sofriam de cãibras horríveis, por não poderem estender suficientemente os membros. As noites eram tão frias e estavam sempre tão molhados que, após algumas horas de sono, só com grande dificuldade se conseguiam mexer. Quando despontou a madrugada do dia 7, era tão grande a miséria física daqueles infelizes que, diz Bligh, "mandei distribuir um pequeno-almoço composto de uma colher de rum e de um pedaço de pão".
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
Na noite de 4 para 5, a tempestade diminuiu de intensidade. Na manhã de 5, Bligh verificou o estado do pão: grande parte estava estragada e bolorenta, mas, em vez de deitá-lo fora, guardou-o cuidadosamente.
Embora a chalupa navegasse agora entre ilhas, a recordação do acolhimento dos indígenas de Tofoa era ainda demasiado viva para que tivessem vontade de aventurar-se em terra. A 6 viram ainda, de longe, algumas ilhas e, pela primeira vez, um peixe mordeu o anzol. Mas a sua alegria foi de pouca duração: "ficámos terrivelmente decepcionados - diz o comandante - porque o perdemos ao içá-lo para bordo." À noite, cada um recebeu para jantar trinta gramas de pão deteriorado e o seu sétimo de litro de água.
"Facilmente se imagina - observa o tenente Bligh - que lutámos com falta de espaço numa embarcação tão miserável." Tentou remediar a situação, estipulando que os homens descansassem por turnos: metade sentada e a outra metade estendida no fundo do barco. Mas apenas o céu os abrigava.
Bligh observa que sofriam de cãibras horríveis, por não poderem estender suficientemente os membros. As noites eram tão frias e estavam sempre tão molhados que, após algumas horas de sono, só com grande dificuldade se conseguiam mexer. Quando despontou a madrugada do dia 7, era tão grande a miséria física daqueles infelizes que, diz Bligh, "mandei distribuir um pequeno-almoço composto de uma colher de rum e de um pedaço de pão".
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
terça-feira, junho 27, 2006
Uma viagem providencial (III)
O tempo enevoa-se
Quando o dia nasceu, a 3 de Maio, os homens verificaram, com desânimo vizinho do desespero, que o Sol subia no horizonte transformado numa bola de fogo vermelha. Era de prever, portanto, uma severa tempestade.
De facto, às oito horas, o vento começou a soprar com violência e o mar encapelou-se. As vagas eram tão altas que a vela pedia, inerte, cada vez que a chalupa era apanhada entre duas ondas, e enfunava-se brutalmente, apesar de pequena, quando a embarcação subia a uma crista. Bligh relata que não poderia arriscar-se a reduzir o pano, tão terrível e constante era o perigo: as vagas varriam a popa e obrigavam-nos a esgotar a água sem descanso e o mais energeticamente possível. «Raramente, estou certo - afirma Bligh -, os homens terão vivido horas mais angustiantes.»
O pão, que levavam dentro de sacos, corria constantemente o risco de se molhar e de criar bolor. Se a situação não melhorasse, as consequências podiam ser fatais, pois mesmo que os dezoito homens se salvassem morreriam de fome. Bligh decidiu então deitar pela borda fora todas as peças de vestuário supérfluas, a maior parte dos rolos de cordame e a vela sobressalente, o que aliviou sensivelmente a embarcação. O carpinteiro despejou também a ferramenta, que alinhou no fundo da chalupa, o que permitiu guardar o pão na caixa e protegê-lo assim da água. Como todos estivessem transidos de frio e encharcados até aos ossos, Bligh ordenou que servissem a cada um, como pequeno almoço, uma colher de rum e um quarto de fruta-pão, esta, ao que parece, já quase intragável. Estava resolvido a fazer respeitar, mesmo com risco da própria vida, o compromisso que, de livre vontade, a tripulação assumira para consigo: queria que a pequena reserva de víveres durasse oito semanas, e sabia que só o conseguiria se impusesse a magra ração diária que calculara.
Depois do almoço, as ondas tornaram-se cada vez mais altas e os homens extenuaram-se a esgotar a água. Quanto ao piloto, cabia-lhe evitar a todo o custo que a chalupa se atravessasse nas vagas. A noite chegou, fria, com a água a encharcar constantemente os pobres homens, de tal modo que, de madrugada, tinham os membros tão entorpecidos que lhes custava mexê-los. Reanimou-os nova colher de rum. Ao pequeno-almoço repartiram entre si cinco pequenos cocos e à noite receberam algumas migalhas de fruta-pão. Em seguida fizeram as suas preces.
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
Quando o dia nasceu, a 3 de Maio, os homens verificaram, com desânimo vizinho do desespero, que o Sol subia no horizonte transformado numa bola de fogo vermelha. Era de prever, portanto, uma severa tempestade.
De facto, às oito horas, o vento começou a soprar com violência e o mar encapelou-se. As vagas eram tão altas que a vela pedia, inerte, cada vez que a chalupa era apanhada entre duas ondas, e enfunava-se brutalmente, apesar de pequena, quando a embarcação subia a uma crista. Bligh relata que não poderia arriscar-se a reduzir o pano, tão terrível e constante era o perigo: as vagas varriam a popa e obrigavam-nos a esgotar a água sem descanso e o mais energeticamente possível. «Raramente, estou certo - afirma Bligh -, os homens terão vivido horas mais angustiantes.»
O pão, que levavam dentro de sacos, corria constantemente o risco de se molhar e de criar bolor. Se a situação não melhorasse, as consequências podiam ser fatais, pois mesmo que os dezoito homens se salvassem morreriam de fome. Bligh decidiu então deitar pela borda fora todas as peças de vestuário supérfluas, a maior parte dos rolos de cordame e a vela sobressalente, o que aliviou sensivelmente a embarcação. O carpinteiro despejou também a ferramenta, que alinhou no fundo da chalupa, o que permitiu guardar o pão na caixa e protegê-lo assim da água. Como todos estivessem transidos de frio e encharcados até aos ossos, Bligh ordenou que servissem a cada um, como pequeno almoço, uma colher de rum e um quarto de fruta-pão, esta, ao que parece, já quase intragável. Estava resolvido a fazer respeitar, mesmo com risco da própria vida, o compromisso que, de livre vontade, a tripulação assumira para consigo: queria que a pequena reserva de víveres durasse oito semanas, e sabia que só o conseguiria se impusesse a magra ração diária que calculara.
Depois do almoço, as ondas tornaram-se cada vez mais altas e os homens extenuaram-se a esgotar a água. Quanto ao piloto, cabia-lhe evitar a todo o custo que a chalupa se atravessasse nas vagas. A noite chegou, fria, com a água a encharcar constantemente os pobres homens, de tal modo que, de madrugada, tinham os membros tão entorpecidos que lhes custava mexê-los. Reanimou-os nova colher de rum. Ao pequeno-almoço repartiram entre si cinco pequenos cocos e à noite receberam algumas migalhas de fruta-pão. Em seguida fizeram as suas preces.
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
segunda-feira, junho 26, 2006
Tenho barcos, tenho remos
Tenho barcos, tenho remos
Tenho navios no mar
Tenho amor ali defronte
E não lhe posso chegar.
Tenho navios no mar
Tenho navios no mar
Tenho amor ali defronte
Não o posso consolar.
Tenho amor ali defronte
Não me posso consolar.
Já fui mar já fui navio
Já fui chalupa escaler
Já fui moço, já sou homem
Só me falta ser mulher.
Só me falta ser mulher
Só me falta ser mulher
Já fui moço, já sou homem
Já fui chalupa escaler.
(José Afonso)
Tenho navios no mar
Tenho amor ali defronte
E não lhe posso chegar.
Tenho navios no mar
Tenho navios no mar
Tenho amor ali defronte
Não o posso consolar.
Tenho amor ali defronte
Não me posso consolar.
Já fui mar já fui navio
Já fui chalupa escaler
Já fui moço, já sou homem
Só me falta ser mulher.
Só me falta ser mulher
Só me falta ser mulher
Já fui moço, já sou homem
Já fui chalupa escaler.
(José Afonso)
Uma viagem providencial (II)
Em Tofoa, primeira decepção e uma morte
Quando, abandonando-os à sua sorte, a Bounty desapareceu no horizonte, o capitão Bligh e os seus dezoito companheiros cuidaram, antes de mais nada, de inventariar os seus recursos. As provisões que alguns camaradas compadecidos lhes tinham lançado constavam de: cerca de setenta quilos de pão, dezassete bocados de carne de porco, cada um com cerca de um quilo, seis litros de rum, seis garrafas de vinho, cento e vinte litros de água potável e quatro pequenos barris vazios.
Como a ilha de Tofoa ficava perto, Bligh decidiu ir lá buscar, imediatamente, água e fruta-pão, a fim de conservar intactos, durante o máximo de tempo possível, os poucos víveres mencionados.
Mas depois de percorrerem a costa viram apenas, no cimo de uma falésia abrupta, alguns coqueiros. Apesar dos perigos da rebentação e da dificuldade em escalar a falésia, conseguiram recolher uma vintena de cocos.
No dia seguinte aventuraram-se no interior da ilha, mas sem resultado. Encontraram no entanto alguns naturais, que os acompanharam até à pequena angra onde fundeara a chalupa, logo seguidos por outros. Os indígenas fizeram algumas perguntas acerca da Bounty e Bligh teve uma inspiração infeliz: recomendou aos companheiros que respondessem que o navio naufragara e que eles eram os únicos sobreviventes. Tratava-se, certamente, de uma mentira inocente, mas Bligh não devia ter dado a conhecer aos nativos que se encontravam em situação de inferioridade. Conseguiram embarcar uma pequena quantidade de fruta-pão, de cocos e de bananas bravas, mas a água que arranjaram foi muito pouca.
Este suplemento de víveres, embora limitado, levantou o moral dos homens. A este respeito, Bligh diz-nos: «Não me olhavam já com aqueles olhos angustiados que fixavam em mim desde que perdêramos de vista o navio. Tinham recuperado um pouco de coragem e pareciam resolvidos a fazer o que pudessem.»
O número de indígenas aumentou, formando na praia um verdadeiro cordão humano. Em breve começaram a entrechocar pedras, sinal que habitualmente precedia um ataque. Com dificuldade, por causa da rebentação, os ingleses conseguiram embarcar os víveres que se encontravam na margem e refugiar-se na chalupa, com excepção de John Norton, cabo de marinheiros, que retirava a faxeita da praia. Os indígenas lançaram-se sobre o infeliz e esmagaram-lhe a cabeça com as pedras. Sobre a chalupa caiu igualmente uma chuva desses projécteis, ferindo mais ou menos todos os ocupantes.
Esta manifestação incitou os ingleses a remarem para o mar alto, mas não tardaram a aperceber-se, consternados, que os indígenas lançavam em sua perseguição pirogas carregadas de pedras. Mais ligeiras, estas embarcações não tardaram a alcançá-los e a infligir-lhes novo ataque.
Como ripostar, se não tinham armas? Apenas podiam apanhar as pedras que lhes atiravam e arremessar-lhas por sua vez, mas nessa luta, nova para eles, os indígenas levavam-lhes a palma.
O supremo recurso que lhes ocorreu foi lançarem à água algumas peças de vestuário, a fim de incitarem os atacantes a abandonar a perseguição. Bligh não hesitou, e as pirogas pararam para recolherem aqueles tesouros. Como a noite se aproximava, fizeram meia volta e regressaram à ilha, com a sua presa. Os dezoito ocupantes da chalupa puderam então meditar em paz na sua dramática situação.
Pediram todos ao comandante que os conduzisse de volta a Inglaterra e ele respondeu que não podia esperar socorros nem assistência antes de chegarem à ilha de Timor, distante, pelo menos, mil e duzentas léguas. Em vista disso, todos se declararam dispostos a contentar-se com uma ração diária, fixada por Bligh, após cálculo das provisões restantes, em trinta gramas de pão e num sétimo de litro de água potável.
O comandante fê-los então jurar, com infinita solenidade, que respeitariam o pacto.
«Afastámo-nos da costa - diz Bligh - para percorrer um oceano quase desconhecido, num barco com cerca de dez metros da proa à popa. Tive, todavia, a satisfação de verificar que todos permaneciam mais contentes do que eu com a nossa sorte. Eram quase oito horas do dia 2 de Maio quando, com a vela na primeira rizadura nos fizemos ao largo. Dividi a minha gente em quartos e pus um pouco de ordem na chalupa. Depois demos graças a Deus e agradecemos-Lhe que nos tivesse poupado miraculosamente. Plenamente confiante na Sua misericordiosa protecção, senti o espírito muito mais tranquilo.»
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
Quando, abandonando-os à sua sorte, a Bounty desapareceu no horizonte, o capitão Bligh e os seus dezoito companheiros cuidaram, antes de mais nada, de inventariar os seus recursos. As provisões que alguns camaradas compadecidos lhes tinham lançado constavam de: cerca de setenta quilos de pão, dezassete bocados de carne de porco, cada um com cerca de um quilo, seis litros de rum, seis garrafas de vinho, cento e vinte litros de água potável e quatro pequenos barris vazios.
Como a ilha de Tofoa ficava perto, Bligh decidiu ir lá buscar, imediatamente, água e fruta-pão, a fim de conservar intactos, durante o máximo de tempo possível, os poucos víveres mencionados.
Mas depois de percorrerem a costa viram apenas, no cimo de uma falésia abrupta, alguns coqueiros. Apesar dos perigos da rebentação e da dificuldade em escalar a falésia, conseguiram recolher uma vintena de cocos.
No dia seguinte aventuraram-se no interior da ilha, mas sem resultado. Encontraram no entanto alguns naturais, que os acompanharam até à pequena angra onde fundeara a chalupa, logo seguidos por outros. Os indígenas fizeram algumas perguntas acerca da Bounty e Bligh teve uma inspiração infeliz: recomendou aos companheiros que respondessem que o navio naufragara e que eles eram os únicos sobreviventes. Tratava-se, certamente, de uma mentira inocente, mas Bligh não devia ter dado a conhecer aos nativos que se encontravam em situação de inferioridade. Conseguiram embarcar uma pequena quantidade de fruta-pão, de cocos e de bananas bravas, mas a água que arranjaram foi muito pouca.
Este suplemento de víveres, embora limitado, levantou o moral dos homens. A este respeito, Bligh diz-nos: «Não me olhavam já com aqueles olhos angustiados que fixavam em mim desde que perdêramos de vista o navio. Tinham recuperado um pouco de coragem e pareciam resolvidos a fazer o que pudessem.»
O número de indígenas aumentou, formando na praia um verdadeiro cordão humano. Em breve começaram a entrechocar pedras, sinal que habitualmente precedia um ataque. Com dificuldade, por causa da rebentação, os ingleses conseguiram embarcar os víveres que se encontravam na margem e refugiar-se na chalupa, com excepção de John Norton, cabo de marinheiros, que retirava a faxeita da praia. Os indígenas lançaram-se sobre o infeliz e esmagaram-lhe a cabeça com as pedras. Sobre a chalupa caiu igualmente uma chuva desses projécteis, ferindo mais ou menos todos os ocupantes.
Esta manifestação incitou os ingleses a remarem para o mar alto, mas não tardaram a aperceber-se, consternados, que os indígenas lançavam em sua perseguição pirogas carregadas de pedras. Mais ligeiras, estas embarcações não tardaram a alcançá-los e a infligir-lhes novo ataque.
Como ripostar, se não tinham armas? Apenas podiam apanhar as pedras que lhes atiravam e arremessar-lhas por sua vez, mas nessa luta, nova para eles, os indígenas levavam-lhes a palma.
O supremo recurso que lhes ocorreu foi lançarem à água algumas peças de vestuário, a fim de incitarem os atacantes a abandonar a perseguição. Bligh não hesitou, e as pirogas pararam para recolherem aqueles tesouros. Como a noite se aproximava, fizeram meia volta e regressaram à ilha, com a sua presa. Os dezoito ocupantes da chalupa puderam então meditar em paz na sua dramática situação.
Pediram todos ao comandante que os conduzisse de volta a Inglaterra e ele respondeu que não podia esperar socorros nem assistência antes de chegarem à ilha de Timor, distante, pelo menos, mil e duzentas léguas. Em vista disso, todos se declararam dispostos a contentar-se com uma ração diária, fixada por Bligh, após cálculo das provisões restantes, em trinta gramas de pão e num sétimo de litro de água potável.
O comandante fê-los então jurar, com infinita solenidade, que respeitariam o pacto.
«Afastámo-nos da costa - diz Bligh - para percorrer um oceano quase desconhecido, num barco com cerca de dez metros da proa à popa. Tive, todavia, a satisfação de verificar que todos permaneciam mais contentes do que eu com a nossa sorte. Eram quase oito horas do dia 2 de Maio quando, com a vela na primeira rizadura nos fizemos ao largo. Dividi a minha gente em quartos e pus um pouco de ordem na chalupa. Depois demos graças a Deus e agradecemos-Lhe que nos tivesse poupado miraculosamente. Plenamente confiante na Sua misericordiosa protecção, senti o espírito muito mais tranquilo.»
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
domingo, junho 25, 2006
Uma viagem providencial (I)
O cruel Christian
A primeira intenção de Christian fora expulsar o comandante e os camaradas no pequeno escaler, e para isso ordenara que o içassem para fora de bordo. O escaler foi, portanto, lançado à água. Era um pobre barco miserável, onde não caberiam mais de oito ou dez homens e muito pouca bagagem, e que, pior ainda, estava tão comido pelo caruncho, tão apodrecido (sobretudo nas pranchas do fundo), que eram de nove contra dez as probabilidades de se afundar antes de percorrer uma milha.
Eis a «carcação putrefacta» onde Christian tencionava abandonar à deriva o que fora seu comandante e dezoito inocentes, ou os que nela pudesse embarcar: encontrariam apenas aquilo que fatalmente os esperava - a morte no fundo do oceano.
No entanto, as vivas censuras do imediato, do contramestre e do carpinteiro acabaram por impressioná-lo e concedeu aos infelizes a chalupa. Nela se apinharam os dezanove. O seu peso, acrescido do dos poucos objectos que os autorizaram a levar, mergulhou de tal modo a embarcação na água que a mais pequena ondulação bastaria para a afundar. Pelo que era humanamente possível prever, não se encontrava em condições de realizar a longa viagem pelo mar alto que aqueles dezanove homens estavam condenados a fazer - e que, miraculosamente e contra toda a esperança, fizeram.
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
A primeira intenção de Christian fora expulsar o comandante e os camaradas no pequeno escaler, e para isso ordenara que o içassem para fora de bordo. O escaler foi, portanto, lançado à água. Era um pobre barco miserável, onde não caberiam mais de oito ou dez homens e muito pouca bagagem, e que, pior ainda, estava tão comido pelo caruncho, tão apodrecido (sobretudo nas pranchas do fundo), que eram de nove contra dez as probabilidades de se afundar antes de percorrer uma milha.
Eis a «carcação putrefacta» onde Christian tencionava abandonar à deriva o que fora seu comandante e dezoito inocentes, ou os que nela pudesse embarcar: encontrariam apenas aquilo que fatalmente os esperava - a morte no fundo do oceano.
No entanto, as vivas censuras do imediato, do contramestre e do carpinteiro acabaram por impressioná-lo e concedeu aos infelizes a chalupa. Nela se apinharam os dezanove. O seu peso, acrescido do dos poucos objectos que os autorizaram a levar, mergulhou de tal modo a embarcação na água que a mais pequena ondulação bastaria para a afundar. Pelo que era humanamente possível prever, não se encontrava em condições de realizar a longa viagem pelo mar alto que aqueles dezanove homens estavam condenados a fazer - e que, miraculosamente e contra toda a esperança, fizeram.
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
Liderança
Em Bligh, tão necessária na viagem de chalupa até Timor, mas tão lamentável nos incidentes que deram origem à revolta na Bounty e que, de uma forma ou de outra, acabou com a vida a tantos homens.
Em Gloria Arroyo, providencial para mil e duzentos condenados à pena capital.
Em Matan Ruak, Longuinhos Monteiro, Lu-Olo, Alkatiri e Xanana...?
Em Gloria Arroyo, providencial para mil e duzentos condenados à pena capital.
Em Matan Ruak, Longuinhos Monteiro, Lu-Olo, Alkatiri e Xanana...?
sábado, junho 24, 2006
A sobrevivência de Bligh
Começo pelo fim. Tudo acaba bem. A viagem do capitão Bligh e dos que o acompanharam depois da revolta na Bounty é dos mais impressionantes relatos de uma sobrevivência e merece ser lido ou relido. É o que proponho.
Dissipa-se o abominável pesadelo
«Não me é possível - declara o extraordinário navegador - descrever a alegria que nos invadiu à vista daquela terra tão desejada. Parecia-nos quase inacreditável que, a bordo de um barco sem ponte, a céu aberto e com tão poucas provisões, tivéssemos conseguido atingir a ilha de Timor, quarenta e um dias depois de deixarmos Tofoa, e percorrido, nesse lapso de tempo, segundo a nossa barquilha, a distância de três mil e seiscentas e dezoito milhas náuticas, sem que nenhum de nós, a despeito da nossa indizível miséria, perecesse no decurso da viagem!
«No domingo 14 de Junho fundearam na baía de Coupang, onde foram recebidos com toda a bondade, hospitalidade e humanidade possíveis e imagináveis. As casas dos notáveis abriram-se de par em par para os acolher. Quase impossibilitados de andar, os infelizes desembarcaram em estado físico verdadeiramente lamentável.
«Raramente, talvez - diz o comandante -, o talento de um pintor poderia manifestar-se melhor do que se pintasse os dois grupos de seres humanos que foram ao encontro um do outro. O espectador indiferente (admitindo que fosse possível existir algum!) sentir-se-ia embaraçado na escolha do objecto da sua admiração: os olhos dos famintos, flamejantes naquela hora de libertação, ou o horror dos que os recebiam, perante semelhantes espectros, cuja aparência esquelética suscitaria, se não lhe conhecessem a causa, maior pavor do que piedade? Tínhamos apenas a pele e o osso, os nossos membros eram uma chaga pegada e vestíamo-nos de farrapos. Foi neste estado, com lágrimas de gratidão e alegria a correrem-nos pelas faces, que a população de Timor nos contemplou, com um misto de horror, estupefacção e pena.
«Quando penso - prossegue o comandante - na maneira providencial como escapámos em Tofoa, simplesmente porque os indígenas renunciaram ao ataque; na viagem de mais de mil e duzentas léguas pelo mar alto sem quase possuirmos meios de assegurar a nossa subsistência e sem o menor abrigo para nos defendermos das inclemências do tempo; quando penso que, numa simples chalupa e sob tão furiosas tempestades, escapámos ao naufrágio, sem nenhum homem ser arrebatado pela doença; que tivemos a sorte inaudita de costear sem incidentes terras habitadas por indígenas hostis e que, finalmente, no termo da nossa provação, encontrámos tão bom acolhimento e tão fraternal amizade; quando penso em todos os milagres que nos conservaram vivos - a realidade de tão extraordinárias graças permite-me suportar, com alegria e bom humor, o fracasso de uma expedição cujo êxito levara tanto a peito e que sobreveio quando me animava a firme esperança de que os resultados da viagem corresponderiam plenamente às intenções de Sua Majestade e satisfariam os autores de tão poderoso projecto.»
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
Dissipa-se o abominável pesadelo
«Não me é possível - declara o extraordinário navegador - descrever a alegria que nos invadiu à vista daquela terra tão desejada. Parecia-nos quase inacreditável que, a bordo de um barco sem ponte, a céu aberto e com tão poucas provisões, tivéssemos conseguido atingir a ilha de Timor, quarenta e um dias depois de deixarmos Tofoa, e percorrido, nesse lapso de tempo, segundo a nossa barquilha, a distância de três mil e seiscentas e dezoito milhas náuticas, sem que nenhum de nós, a despeito da nossa indizível miséria, perecesse no decurso da viagem!
«No domingo 14 de Junho fundearam na baía de Coupang, onde foram recebidos com toda a bondade, hospitalidade e humanidade possíveis e imagináveis. As casas dos notáveis abriram-se de par em par para os acolher. Quase impossibilitados de andar, os infelizes desembarcaram em estado físico verdadeiramente lamentável.
«Raramente, talvez - diz o comandante -, o talento de um pintor poderia manifestar-se melhor do que se pintasse os dois grupos de seres humanos que foram ao encontro um do outro. O espectador indiferente (admitindo que fosse possível existir algum!) sentir-se-ia embaraçado na escolha do objecto da sua admiração: os olhos dos famintos, flamejantes naquela hora de libertação, ou o horror dos que os recebiam, perante semelhantes espectros, cuja aparência esquelética suscitaria, se não lhe conhecessem a causa, maior pavor do que piedade? Tínhamos apenas a pele e o osso, os nossos membros eram uma chaga pegada e vestíamo-nos de farrapos. Foi neste estado, com lágrimas de gratidão e alegria a correrem-nos pelas faces, que a população de Timor nos contemplou, com um misto de horror, estupefacção e pena.
«Quando penso - prossegue o comandante - na maneira providencial como escapámos em Tofoa, simplesmente porque os indígenas renunciaram ao ataque; na viagem de mais de mil e duzentas léguas pelo mar alto sem quase possuirmos meios de assegurar a nossa subsistência e sem o menor abrigo para nos defendermos das inclemências do tempo; quando penso que, numa simples chalupa e sob tão furiosas tempestades, escapámos ao naufrágio, sem nenhum homem ser arrebatado pela doença; que tivemos a sorte inaudita de costear sem incidentes terras habitadas por indígenas hostis e que, finalmente, no termo da nossa provação, encontrámos tão bom acolhimento e tão fraternal amizade; quando penso em todos os milagres que nos conservaram vivos - a realidade de tão extraordinárias graças permite-me suportar, com alegria e bom humor, o fracasso de uma expedição cujo êxito levara tanto a peito e que sobreveio quando me animava a firme esperança de que os resultados da viagem corresponderiam plenamente às intenções de Sua Majestade e satisfariam os autores de tão poderoso projecto.»
Sir John Barrow, "Revolta na Bounty", tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, Publicações Europa-América, 1972
sexta-feira, junho 23, 2006
Timor-Leste: dúvidas
1. A manifestação que hoje começou foi autorizada? Se sim, em que intervalo de tempo?
2. Qual o programa e com que organizações exteriores a Timor-Leste têm ligações os segundo e terceiro partidos mais votados timorenses?
2. Qual o programa e com que organizações exteriores a Timor-Leste têm ligações os segundo e terceiro partidos mais votados timorenses?
quarta-feira, junho 21, 2006
terça-feira, junho 20, 2006
Dia Mundial dos Refugiados
Durante quase quatro décadas de guerra, os exércitos angolanos e estrangeiros teriam espalhado entre 10 e 12 milhões de minas de 67 diferentes tipos. Angola, 1997.
(Sebastião Salgado)
Thought
Of obedience, faith, adhesiveness;
As I stand aloof and look, there is to me something profoundly affecting
in large masses of men, following the lead of those who
do not believe in men.
(Walt Whitman, Leaves of Grass)
As I stand aloof and look, there is to me something profoundly affecting
in large masses of men, following the lead of those who
do not believe in men.
(Walt Whitman, Leaves of Grass)
Thought
Of Equality - as if it harm'd me, giving others the same chances and
rights as myself - as if it were not indispensable to my
own rights that others possess the same.
(Walt Whitman, Leaves of Grass)
rights as myself - as if it were not indispensable to my
own rights that others possess the same.
(Walt Whitman, Leaves of Grass)
segunda-feira, junho 19, 2006
This moment yearning and thoughtful
This moment yearning and thoughtful, sitting alone,
It seems to me there are other men in other lands, yearning and thoughtful;
It seems to me I can look over and behold them, in Germany, Italy, France, Spain,
Or far, far away, in China, or in Russia or India, talking other dialects;
And it seems to me if I could know those men, I should become attached to them, as I do to men in my own lands;
O I know we should be brethren and lovers,
I know I should be happy with them.
(Walt Whitman)
It seems to me there are other men in other lands, yearning and thoughtful;
It seems to me I can look over and behold them, in Germany, Italy, France, Spain,
Or far, far away, in China, or in Russia or India, talking other dialects;
And it seems to me if I could know those men, I should become attached to them, as I do to men in my own lands;
O I know we should be brethren and lovers,
I know I should be happy with them.
(Walt Whitman)
Registo
Ganhou o sim no referendo sobre mais autonomia para a Catalunha. (Quando é que a Espanha se desintegra? É para isto que serve uma monarquia?)
domingo, junho 18, 2006
I sing the body electric
1
I sing the body electric,
The armies of those I love engirth me and I engirth them,
They will not let me off till I go with them, respond to them,
And discorrupt them, and charge them full with the charge of the soul.
Was it doubted that those who corrupt their own bodies conceal themselves?
And if those who defile the living are as bad as they who defile the dead?
And if the body does not do fully as much as the soul?
And if the body were not the soul, what is the soul?
(Walt Whitman)
I sing the body electric,
The armies of those I love engirth me and I engirth them,
They will not let me off till I go with them, respond to them,
And discorrupt them, and charge them full with the charge of the soul.
Was it doubted that those who corrupt their own bodies conceal themselves?
And if those who defile the living are as bad as they who defile the dead?
And if the body does not do fully as much as the soul?
And if the body were not the soul, what is the soul?
(Walt Whitman)
sexta-feira, junho 16, 2006
Dúvida
Escreveria Luís Vaz em blogs lamuriando-se por a esmagadora maioria das "gajas boas" deste mundo lhe ser inacessível?
Desassossego
280.
Ó noite onde as estrelas mentem luz, ó noite, única coisa do tamanho do Universo, torna-me, corpo e alma, parte do teu corpo, que eu me perca em ser mera treva e me torne noite também, sem sonhos que sejam estrelas em mim, nem sol esperado que ilumine o futuro.
(Bernardo Soares)
Ó noite onde as estrelas mentem luz, ó noite, única coisa do tamanho do Universo, torna-me, corpo e alma, parte do teu corpo, que eu me perca em ser mera treva e me torne noite também, sem sonhos que sejam estrelas em mim, nem sol esperado que ilumine o futuro.
(Bernardo Soares)
Empregos
"Já não há empregos", ouve-se frequentemente. Habituamo-nos, portanto, ao trabalho sem direitos, sem contrato, com salários abaixo do salário mínimo, aos estágios sucessivos sem vencimento "para fazer currículo", aos recibos verdes sem direito a subsídio de doença nem a subsídio de desemprego. O trabalho não qualificado é preferencialmente para os imigrantes, pela fragilidade que facilita a exploração. Entre part-times e trabalho temporário, passa-se rapidamente da situação de falta de experiência profissional para a de idade avançada para o mercado de trabalho. O especialista não é valorizado, porque o mais importante é a "flexibilidade". Sem "conhecimentos", não há acesso a muitos postos de trabalho. E o empreendedorismo é só para quem pode.
No entanto, a maior despesa fixa dos comuns mortais, a habitação, requer rendimentos fixos. Não podemos ser todos Cortos Malteses, viver em constante aventura deambulante. Uma profissão ajudava, em tempos idos, a estruturar uma identidade em cada trabalhador. Agora, para preencher o vazio, restam os comprimidos mágicos, as telenovelas, os reality-shows, o futebol.
No entanto, a maior despesa fixa dos comuns mortais, a habitação, requer rendimentos fixos. Não podemos ser todos Cortos Malteses, viver em constante aventura deambulante. Uma profissão ajudava, em tempos idos, a estruturar uma identidade em cada trabalhador. Agora, para preencher o vazio, restam os comprimidos mágicos, as telenovelas, os reality-shows, o futebol.
quinta-feira, junho 15, 2006
A mis soledades voy...
A mis soledades voy,
de mis soledades vengo,
porque para andar conmigo
me bastan mis pensamientos.
¡No sé qué tiene la aldea
donde vivo y donde muero,
que con venir de mí mismo
no puedo venir más lejos!
Ni estoy bien ni mal conmigo;
mas dice mi entendimiento
que un hombre que todo es alma
está cautivo en su cuerpo.
Entiendo lo que me basta,
y solamente no entiendo
cómo se sufre a sí mismo
un ignorante soberbio.
De cuantas cosas me cansan,
fácimente me defiendo;
pero no puedo guardarme
de los peligros de un necio.
El dirá que yo lo soy,
pero con falso argumento,
que humildad y necedad
no caben en un sujeto.
La diferencia conozco,
porque en él y en mí contemplo,
su locura en su arrogancia,
mi humildad en su desprecio.
O sabe naturaleza
más que supo en otro tiempo,
o tantos que nacen sabios
es porque lo dicen ellos.
Sólo sé que no sé nada,
dixo un filósofo, haciendo
la cuenta con su humildad,
adonde lo más es menos.
No me precio de entendido,
de desdichado me precio,
que los que no son dichosos,
¿cómo pueden ser discretos?
No puede durar el mundo,
porque dicen, y lo creo,
que suena a vidrio quebrado
y que ha de romperse presto.
Señales son del jüicio
ver que todos le perdemos,
unos por carta de más
otros por cartas de menos.
Dijeron que antiguamente
se fue la verdad al cielo;
tal la pusieron los hombres
que desde entonces no ha vuelto.
En dos edades vivimos
los propios y los ajenos:
la de plata los extraños
y la de cobre los nuestros.
¿A quién no dará cuidado,
si es español verdadero,
ver los hombres a lo antiguo
y el valor a lo moderno?
Dixo Dios que comería
su pan el hombre primero
con el sudor de su cara
por quebrar su mandamiento,
y algunos inobedientes
a la vergüenza y al miedo,
con las prendas de su honor
han trocado los efectos.
Virtud y filosofía
peregrina como ciegos;
el uno se lleva al otro,
llorando van y pidiendo.
Dos polos tiene la tierra,
universal movimiento;
la mejor vida el favor,
la mejor sangre el dinero.
Oigo tañer las campanas,
y no me espanto, aunque puedo,
que en lugar de tantas cruces
haya tantos hombres muertos.
Mirando estoy los sepulcros
cuyos mármoles eternos
están diciendo sin lengua
que no lo fueron sus dueños.
¡Oh, bien haya quien los hizo,
porque solamente en ellos
de los poderosos grandes
se vengaron los pequeños!
Fea pintan a la envidia,
yo confieso que la tengo
de unos hombres que no saben
quién vive pared en medio.
Sin libros y sin papeles,
sin tratos, cuentas ni cuentos,
cuando quieren escribir
piden prestado el tintero.
Sin ser pobres ni ser ricos,
tienen chimenea y huerto;
no los despiertan cuidados,
ni pretensiones, ni pleitos.
Ni mumuraron del grande,
ni ofendieron al pequeño;
nunca, como yo, afirmaron
parabién, ni pascua dieron.
Con esta envidia que digo
y lo que paso en silencio,
a mis soledades voy,
de mis soledades vengo.
(Lope de Vega)
de mis soledades vengo,
porque para andar conmigo
me bastan mis pensamientos.
¡No sé qué tiene la aldea
donde vivo y donde muero,
que con venir de mí mismo
no puedo venir más lejos!
Ni estoy bien ni mal conmigo;
mas dice mi entendimiento
que un hombre que todo es alma
está cautivo en su cuerpo.
Entiendo lo que me basta,
y solamente no entiendo
cómo se sufre a sí mismo
un ignorante soberbio.
De cuantas cosas me cansan,
fácimente me defiendo;
pero no puedo guardarme
de los peligros de un necio.
El dirá que yo lo soy,
pero con falso argumento,
que humildad y necedad
no caben en un sujeto.
La diferencia conozco,
porque en él y en mí contemplo,
su locura en su arrogancia,
mi humildad en su desprecio.
O sabe naturaleza
más que supo en otro tiempo,
o tantos que nacen sabios
es porque lo dicen ellos.
Sólo sé que no sé nada,
dixo un filósofo, haciendo
la cuenta con su humildad,
adonde lo más es menos.
No me precio de entendido,
de desdichado me precio,
que los que no son dichosos,
¿cómo pueden ser discretos?
No puede durar el mundo,
porque dicen, y lo creo,
que suena a vidrio quebrado
y que ha de romperse presto.
Señales son del jüicio
ver que todos le perdemos,
unos por carta de más
otros por cartas de menos.
Dijeron que antiguamente
se fue la verdad al cielo;
tal la pusieron los hombres
que desde entonces no ha vuelto.
En dos edades vivimos
los propios y los ajenos:
la de plata los extraños
y la de cobre los nuestros.
¿A quién no dará cuidado,
si es español verdadero,
ver los hombres a lo antiguo
y el valor a lo moderno?
Dixo Dios que comería
su pan el hombre primero
con el sudor de su cara
por quebrar su mandamiento,
y algunos inobedientes
a la vergüenza y al miedo,
con las prendas de su honor
han trocado los efectos.
Virtud y filosofía
peregrina como ciegos;
el uno se lleva al otro,
llorando van y pidiendo.
Dos polos tiene la tierra,
universal movimiento;
la mejor vida el favor,
la mejor sangre el dinero.
Oigo tañer las campanas,
y no me espanto, aunque puedo,
que en lugar de tantas cruces
haya tantos hombres muertos.
Mirando estoy los sepulcros
cuyos mármoles eternos
están diciendo sin lengua
que no lo fueron sus dueños.
¡Oh, bien haya quien los hizo,
porque solamente en ellos
de los poderosos grandes
se vengaron los pequeños!
Fea pintan a la envidia,
yo confieso que la tengo
de unos hombres que no saben
quién vive pared en medio.
Sin libros y sin papeles,
sin tratos, cuentas ni cuentos,
cuando quieren escribir
piden prestado el tintero.
Sin ser pobres ni ser ricos,
tienen chimenea y huerto;
no los despiertan cuidados,
ni pretensiones, ni pleitos.
Ni mumuraron del grande,
ni ofendieron al pequeño;
nunca, como yo, afirmaron
parabién, ni pascua dieron.
Con esta envidia que digo
y lo que paso en silencio,
a mis soledades voy,
de mis soledades vengo.
(Lope de Vega)
Timor-Leste: o que as línguas dizem
Gosto de conhecer peculiaridades linguísticas que revelem um entendimento da realidade muito diferente do meu. Por exemplo, nas línguas de Timor, há uma diferença entre "nós, contigo/convosco incluído(s)" e "nós, sem ti/vós incluído(s)". É como se houvesse uma necessidade diária de distinguir o universal do que é particular do grupo, sendo que este pode ser o clã, mas não só. Em populações pequenas e isoladas, a defesa das tradições e das memórias ancestrais parece vital para a manutenção de uma identidade comum. Tragicamente, parecem não ter entendido os perigos biológicos e culturais da consanguinidade e do isolamento.
Há também a diferenciação entre "irmão mais velho" e "irmão mais novo" (e o mesmo para as irmãs), que parece uma manifestação de respeito pelo tempo e pela experiência. Mas este respeito pode ser, muitas vezes, inimigo da democracia e do progresso.
Há, depois, a curiosa utilização da língua. Os líderes religiosos e políticos timorenses usam a palavra "povo" de uma forma sui generis, nunca se incluindo na abstracção. É como se esse "povo" fosse o "povinho" português, a quem, curiosamente, têm dito, nos últimos tempos, que não tem capacidade para a sua auto-determinação. E isso, a falta de orgulho e de esperança, a juntar à falta de bens e à falta de segurança, é muito triste.
Há também a diferenciação entre "irmão mais velho" e "irmão mais novo" (e o mesmo para as irmãs), que parece uma manifestação de respeito pelo tempo e pela experiência. Mas este respeito pode ser, muitas vezes, inimigo da democracia e do progresso.
Há, depois, a curiosa utilização da língua. Os líderes religiosos e políticos timorenses usam a palavra "povo" de uma forma sui generis, nunca se incluindo na abstracção. É como se esse "povo" fosse o "povinho" português, a quem, curiosamente, têm dito, nos últimos tempos, que não tem capacidade para a sua auto-determinação. E isso, a falta de orgulho e de esperança, a juntar à falta de bens e à falta de segurança, é muito triste.
quarta-feira, junho 14, 2006
Timor-Leste: notas
Díli, 14 Jun (Lusa) (...) A violência das últimas semanas em Timor-Leste, que começou em finais de Abril com o despedimento de cerca de 600 militares que se queixaram de alegada discriminação étnica por parte da hierarquia das forças armadas, já causou mais de duas dezenas de mortos em confrontos entre grupos rivais. (...) AR.
O que aconteceria em Portugal se um grupo de militares abandonasse os quartéis durante semanas em protesto? Vejamos.
Lei n.o 100/2003 de 15 de Novembro
Artigo 72.o
Deserção
1 — Comete o crime de deserção o militar que:
a) Se ausentar, sem licença ou autorização, do seu posto ou local de serviço e se mantenha na situação de ausência ilegítima por 10 dias consecutivos; (...)
Artigo 74.o
Punição da deserção
1 — O oficial que cometa o crime de deserção é punido:
a) Em tempo de guerra, com pena de prisão de 5 a 12 anos;
b) Em tempo de paz, com pena de prisão de 1 a 4 anos.
2 — Os sargentos e os praças que cometam o crime de deserção são condenados:
a) Em tempo de guerra, com pena de prisão de 2 a 8 anos;
b) Em tempo de paz, com pena de prisão de 1 a 4 anos. (...)
O que fez Portugal até agora para ajudar a encontrar uma solução ("política"?) para os peticionistas, que se encontram acantonados, mas não armados, e que aparentemente são protegidos pelo Presidente da República de Timor-Leste? Ou terão de ser outros, mais uma vez, a fazer o trabalho?
O que aconteceria em Portugal se um grupo de militares abandonasse os quartéis durante semanas em protesto? Vejamos.
Lei n.o 100/2003 de 15 de Novembro
Artigo 72.o
Deserção
1 — Comete o crime de deserção o militar que:
a) Se ausentar, sem licença ou autorização, do seu posto ou local de serviço e se mantenha na situação de ausência ilegítima por 10 dias consecutivos; (...)
Artigo 74.o
Punição da deserção
1 — O oficial que cometa o crime de deserção é punido:
a) Em tempo de guerra, com pena de prisão de 5 a 12 anos;
b) Em tempo de paz, com pena de prisão de 1 a 4 anos.
2 — Os sargentos e os praças que cometam o crime de deserção são condenados:
a) Em tempo de guerra, com pena de prisão de 2 a 8 anos;
b) Em tempo de paz, com pena de prisão de 1 a 4 anos. (...)
O que fez Portugal até agora para ajudar a encontrar uma solução ("política"?) para os peticionistas, que se encontram acantonados, mas não armados, e que aparentemente são protegidos pelo Presidente da República de Timor-Leste? Ou terão de ser outros, mais uma vez, a fazer o trabalho?
segunda-feira, junho 12, 2006
Ah! minha Dinamene! Assim deixaste
Quem não deixara nunca de querer-te!
Ah! Ninfa minha, já não posso ver-te,
Tão asinha esta vida desprezaste!
Como já pera sempre te apartaste
De quem tão longe estava de perder-te?
Puderam estas ondas defender-te
Que não visses quem tanto magoaste?
Nem falar-te somente a dura Morte
Me deixou, que tão cedo o negro manto
Em teus olhos deitado consentiste!
Oh mar! oh céu! oh minha escura sorte!
Que pena sentirei que valha tanto,
Que inda tenha por pouco viver triste?
(Luís de Camões)
Quem não deixara nunca de querer-te!
Ah! Ninfa minha, já não posso ver-te,
Tão asinha esta vida desprezaste!
Como já pera sempre te apartaste
De quem tão longe estava de perder-te?
Puderam estas ondas defender-te
Que não visses quem tanto magoaste?
Nem falar-te somente a dura Morte
Me deixou, que tão cedo o negro manto
Em teus olhos deitado consentiste!
Oh mar! oh céu! oh minha escura sorte!
Que pena sentirei que valha tanto,
Que inda tenha por pouco viver triste?
(Luís de Camões)
domingo, junho 11, 2006
A linguagem das flores
(Pierre-Auguste Renoir)
«Antigamente as flores tinham, entre os seus numerosos encantos, a tarefa de transmitirem subtis mensagens amorosas, mas na pressa do século vinte esta arte transformou-se numa linguagem morta. Não penso que convenha ressuscitá-la. É como o sânscrito, não há com quem o falar. (...)
«[E]ra possível [em Inglaterra, nas décadas que se seguiram a 1718] manter uma longa correspondência sem uma única palavra escrita usando diversas combinações num ramo. As damas punham grande cuidado na escolha do papel para os seus cartões, porque até as flores pintadas podiam conter outras intenções. Um lenço bordado com amores-perfeitos era uma indicação de que ela nunca esqueceria o seu apaixonado, com rosas, uma promessa de amor. Se a agulha criava com mestria a flor do marmeleiro, o destinatário podia considerar-se afortunado, porque indicava fidelidade total para o resto da vida. Chegou-se ao ponto de a orientação do laço num ramo determinar se os sentimentos se referiam ao doador ou ao receptor; a mão com a qual se apresentava ou aceitava a oferta mudava o desígnio, assim como o lugar do corpo escolhido pela mulher para as ter: quanto mais perto do coração, mais receptividade ao amor. Daí vem a tradição de oferecer orquídeas antes de uma festa; a dama escolhe o lugar onde prendê-la, na anca, na cintura, no cabelo ou no peito. É um costume abominável: não há vestido que fique bem com esse espantalho em cima. (...) Umas noções básicas são suficientes: o vermelho anuncia paixão, o branco pureza, o cor-de-rosa ternura, o amarelo esquecimento, o roxo modéstia (mas agora também é a cor das feministas). (...)
«Segundo a linguagem clássica das flores, o miosótis significa amor verdadeiro e recordação. Uma lenda austríaca diz que dois namorados caminhavam ao longo do Danúbio quando a jovem (caprichosa, evidentemente) viu uma pequena flor azul a flutuar na água e quis tê-la imediatamente. O jovem lançou-se ao rio para a apanhar, mas foi levado pela corrente e começou a afogar-se. Com as suas últimas forças alcançou a flor e atirou-a à namorada dizendo-lhe "não me esqueças".»
(Isabel Allende, Afrodite)
Wishful thinking
E se Freitas do Amaral tivesse razão e o futebol tivesse mesmo um papel diplomático a desempenhar? Por exemplo, e se o Mundial de Futebol fizesse com que os revoltosos timorenses entregassem as armas e fossem para casa comer caracóis (cof!), beber cerveja e torcer por uma equipa qualquer?
Monopólios
O Google, o Blogger, o Technorati, o blo.gs são quase monopólios. Com as desvantagens dos monopólios, ao que parece. Não há por aí ninguém para lhes fazer concorrência?
Dúvida
Um adjectivo para os resultados das pesquisas do Google, que puxam descaradamente para o cimo da lista os blogs?
sábado, junho 10, 2006
Longe das multidões
Nove dias de fim-de-semana prolongado, dias de sol e um mundial de futebol. Deve ser o paraíso de algumas pessoas. Enjoy!
A morte do líder terrorista
Mataram há dias um homem responsável pela morte de muitos outros homens e mulheres e crianças. Também mataram uma criança, um dano colateral. Ouviram-se vozes de júbilo pelo mundo inteiro, por ter morrido alguém que se transformou num monstro, julgando-se santo guerreiro em luta contra o mal. Criou-se mais um mártir, outros virão atrás dele. Entretanto, deste lado, enganamo-nos, julgando pertencer a uma qualquer civilização superior. Mas matamos, como eles.
Pois meus olhos não cansam de chorar
Tristezas, que não cansam de cansar-me;
Pois não abranda o fogo em que abrasar-me
Pôde quem eu jamais pude abrandar;
Não canse o cego Amor de me guiar
A parte donde não saiba tornar-me;
Nem deixe o mundo todo de escutar-me,
Enquanto me a voz fraca não deixar.
E se nos montes, rios, ou em vales,
Piedade mora, ou dentro mora Amor
Em feras, aves, plantas, pedras, águas,
Ouçam a longa história de meus males
E curem sua dor com minha dor;
Que grandes mágoas podem curar mágoas.
(Luís Vaz de Camões, WikiSource)
Tristezas, que não cansam de cansar-me;
Pois não abranda o fogo em que abrasar-me
Pôde quem eu jamais pude abrandar;
Não canse o cego Amor de me guiar
A parte donde não saiba tornar-me;
Nem deixe o mundo todo de escutar-me,
Enquanto me a voz fraca não deixar.
E se nos montes, rios, ou em vales,
Piedade mora, ou dentro mora Amor
Em feras, aves, plantas, pedras, águas,
Ouçam a longa história de meus males
E curem sua dor com minha dor;
Que grandes mágoas podem curar mágoas.
(Luís Vaz de Camões, WikiSource)
Registo
"Austrália quer luz verde da ONU para controlar Timor-Leste. Documento confidencial revela a estratégia de Camberra para a reunião do Conselho de Segurança na próxima semana" - capa do Diário de Notícias de 10.6.06. No interior:
A Austrália entende que o Estado timorense falhou e que as autoridades de Díli não estão em condições de recuperar o controlo do país. Pelo que deveria ser a ONU a liderar o processo de reconciliação, ajudando a credibilizar as principais funções do Estado, de forma a poderem ser convocadas eleições para Maio do próximo ano.
O que pressupõe, entre outros aspectos, que a polícia timorense pudesse ser comandada por um oficial estrangeiro, à semelhança do que sucederia com o aparelho judiciário do país. Mesmo que fosse necessário recorrer à nomeação de juízes, procuradores, defensores públicos e até oficiais de justiça internacionais.
Já quanto à estabilização, Camberra entende que as forças envolvidas nesse esforço deveriam manter-se sob comando e controlo do contingente internacional, recusando o chapéu da ONU.
É isto que resulta de um documento confidencial australiano a que o DN teve acesso - East Timor: A Future UN Mission - e que deverá servir como documento-guia para Camberra no âmbito da definição de uma nova missão da ONU para Timor-Leste. (...)
A Austrália entende que o Estado timorense falhou e que as autoridades de Díli não estão em condições de recuperar o controlo do país. Pelo que deveria ser a ONU a liderar o processo de reconciliação, ajudando a credibilizar as principais funções do Estado, de forma a poderem ser convocadas eleições para Maio do próximo ano.
O que pressupõe, entre outros aspectos, que a polícia timorense pudesse ser comandada por um oficial estrangeiro, à semelhança do que sucederia com o aparelho judiciário do país. Mesmo que fosse necessário recorrer à nomeação de juízes, procuradores, defensores públicos e até oficiais de justiça internacionais.
Já quanto à estabilização, Camberra entende que as forças envolvidas nesse esforço deveriam manter-se sob comando e controlo do contingente internacional, recusando o chapéu da ONU.
É isto que resulta de um documento confidencial australiano a que o DN teve acesso - East Timor: A Future UN Mission - e que deverá servir como documento-guia para Camberra no âmbito da definição de uma nova missão da ONU para Timor-Leste. (...)
Exílio
Quando a pátria que temos não a temos
Perdida por silêncios e por renúncia
Até a voz do mar se torna exílio
E a luz que nos rodeia é como grades
(Sophia de Mello Breyner Andresen)
Perdida por silêncios e por renúncia
Até a voz do mar se torna exílio
E a luz que nos rodeia é como grades
(Sophia de Mello Breyner Andresen)
sexta-feira, junho 09, 2006
O Me! O Life!
O me! O life!… of the questions of these recurring;
Of the endless trains of the faithless—of cities fill’d with the foolish;
Of myself forever reproaching myself, (for who more foolish than I, and who more faithless?)
Of eyes that vainly crave the light—of the objects mean—of the struggle ever renew’d;
Of the poor results of all—of the plodding and sordid crowds I see around me;
Of the empty and useless years of the rest—with the rest me intertwined;
The question, O me! so sad, recurring—What good amid these, O me, O life?
Answer.
That you are here—that life exists, and identity;
That the powerful play goes on, and you will contribute a verse.
Walt Whitman, Leaves of Grass
Of the endless trains of the faithless—of cities fill’d with the foolish;
Of myself forever reproaching myself, (for who more foolish than I, and who more faithless?)
Of eyes that vainly crave the light—of the objects mean—of the struggle ever renew’d;
Of the poor results of all—of the plodding and sordid crowds I see around me;
Of the empty and useless years of the rest—with the rest me intertwined;
The question, O me! so sad, recurring—What good amid these, O me, O life?
Answer.
That you are here—that life exists, and identity;
That the powerful play goes on, and you will contribute a verse.
Walt Whitman, Leaves of Grass
quinta-feira, junho 08, 2006
As I Ponder'd in Silence
As I ponder'd in silence,
Returning upon my poems, considering, lingering long,
A Phantom arose before me with distrustful aspect,
Terrible in beauty, age, and power,
The genius of poets of old lands,
As to me directing like flame its eyes,
With finger pointing to many immortal songs,
And menacing voice, What singest thou? it said,
Know'st thou not there is hut one theme for ever-enduring bards?
And that is the theme of War, the fortune of battles,
The making of perfect soldiers.
Be it so, then I answer'd,
I too haughty Shade also sing war, and a longer and greater one than any,
Waged in my book with varying fortune, with flight, advance
and retreat, victory deferr'd and wavering,
(Yet methinks certain, or as good as certain, at the last,) the
field the world,
For life and death, for the Body and for the eternal Soul,
Lo, I too am come, chanting the chant of battles,
I above all promote brave soldiers.
Walt Whitman, Leaves of Grass
Returning upon my poems, considering, lingering long,
A Phantom arose before me with distrustful aspect,
Terrible in beauty, age, and power,
The genius of poets of old lands,
As to me directing like flame its eyes,
With finger pointing to many immortal songs,
And menacing voice, What singest thou? it said,
Know'st thou not there is hut one theme for ever-enduring bards?
And that is the theme of War, the fortune of battles,
The making of perfect soldiers.
Be it so, then I answer'd,
I too haughty Shade also sing war, and a longer and greater one than any,
Waged in my book with varying fortune, with flight, advance
and retreat, victory deferr'd and wavering,
(Yet methinks certain, or as good as certain, at the last,) the
field the world,
For life and death, for the Body and for the eternal Soul,
Lo, I too am come, chanting the chant of battles,
I above all promote brave soldiers.
Walt Whitman, Leaves of Grass
quarta-feira, junho 07, 2006
INJUSTICE, n.
A burden which of all those that we load upon others and carry ourselves is lightest in the hands and heaviest upon the back.
Ambrose Bierce, The Devil's Dictionary
Ambrose Bierce, The Devil's Dictionary
Muito obrigada
Pelas mensagens que chegam por meios que a tecnologia não permitia ainda há pouco tempo.
Timor-Leste: perplexidade (II)
"O bispo de Baucau, D. Basílio de Nascimento, considerou hoje que a disponibilidade demonstrada por José Ramos Horta par a suceder ao actual primeiro-ministro timorense é «uma autocandidatura muito boa», mas admitiu haver outras hipóteses." (Lusa, 7/6/06)
"[H]á analistas internacionais a dizerem que tenho sido considerado um negociador muito duro dos litígios com os países vizinhos, particularmente com a Austrália. Quando se é primeiro-ministro e a última pessoa a decidir sobre o petróleo neste país, naturalmente está a colocar-se como alvo" - Mari Alkatiri (Lusa, 7/6/06).
"Não tarda, estão a dizer-nos que não vamos saber gerir as nossas riquezas. Ou que os terminais de gás nunca poderão ficar estacionados aqui em Timor-Leste." - Ângela Carrascalão
"[H]á analistas internacionais a dizerem que tenho sido considerado um negociador muito duro dos litígios com os países vizinhos, particularmente com a Austrália. Quando se é primeiro-ministro e a última pessoa a decidir sobre o petróleo neste país, naturalmente está a colocar-se como alvo" - Mari Alkatiri (Lusa, 7/6/06).
"Não tarda, estão a dizer-nos que não vamos saber gerir as nossas riquezas. Ou que os terminais de gás nunca poderão ficar estacionados aqui em Timor-Leste." - Ângela Carrascalão
Canção
A voz da minha canção
é de uma dor que a alma toca,
que os agudos leva a boca,
os graves o coração.
As palavras são as dores
que andam no pensamento,
padecendo o sofrimento
que as torna ainda maiores.
De tal som marcadas vão
que a sua voz a alma toca,
que os agudos leva a boca,
os graves, o coração.
(Pinar, Espanha, séc. XV, tradução de José Bento)
é de uma dor que a alma toca,
que os agudos leva a boca,
os graves o coração.
As palavras são as dores
que andam no pensamento,
padecendo o sofrimento
que as torna ainda maiores.
De tal som marcadas vão
que a sua voz a alma toca,
que os agudos leva a boca,
os graves, o coração.
(Pinar, Espanha, séc. XV, tradução de José Bento)
segunda-feira, junho 05, 2006
Frenologia
Carl Sagan usou o cérebro imaginado por Broca, com as suas funções cerebrais acantonadas, como mote para um livro sobre "pseudo-ciência". Os usos da frenologia ao longo dos tempos são, aliás, de péssima memória (péssima mesmo!), mas os mapas frenológicos não deixam de ser curiosidades museológicas e a rede ajuda a encontrar preciosidades.
O cérebro que convenceu Broca da localização das funções cerebrais:
Mapas frenológicos para todos os gostos:
O último mapa é de um sítio que defende a frenologia, e onde se dão "exemplos" de como, supostamente, a forma do crânio estaria relacionada com características da personalidade.
Finalmente, quais são as origens do conhecimento das funções cerebrais? Vejamos.
For many millennia the function of the brain was unknown. Ancient Egyptians threw the brain away prior to the process of mummification. Ancient thinkers such as Aristotle imagined that mental activity took place in the heart. Greek scholars assumed correctly that the brain serves a role in cooling the body, but incorrectly presumed the brain to function as a sort of radiator, rather than as a thermostat as is now understood. The Alexandrian biologists Herophilos and Erasistratus were among the first to conclude that the brain was the seat of intelligence. Galen's theory that the brain's ventricles were the sites of thought and emotion prevailed until the work of the Renaissance anatomist Vesalius.
(Wikipedia: Human brain - Study of the brain)
Para saber mais: Broca's area / Wernicke's area / Phrenology
O cérebro que convenceu Broca da localização das funções cerebrais:
Mapas frenológicos para todos os gostos:
O último mapa é de um sítio que defende a frenologia, e onde se dão "exemplos" de como, supostamente, a forma do crânio estaria relacionada com características da personalidade.
Finalmente, quais são as origens do conhecimento das funções cerebrais? Vejamos.
For many millennia the function of the brain was unknown. Ancient Egyptians threw the brain away prior to the process of mummification. Ancient thinkers such as Aristotle imagined that mental activity took place in the heart. Greek scholars assumed correctly that the brain serves a role in cooling the body, but incorrectly presumed the brain to function as a sort of radiator, rather than as a thermostat as is now understood. The Alexandrian biologists Herophilos and Erasistratus were among the first to conclude that the brain was the seat of intelligence. Galen's theory that the brain's ventricles were the sites of thought and emotion prevailed until the work of the Renaissance anatomist Vesalius.
(Wikipedia: Human brain - Study of the brain)
Para saber mais: Broca's area / Wernicke's area / Phrenology
domingo, junho 04, 2006
Problemas da descentralização dos concursos de professores
Quando for norma as escolas contratarem os seus professores, os jornais (através da publicidade) e os CTT (através dos milhares de respostas aos anúncios) vão ficar a lucrar bastante. Nas escolas, terá de haver pessoas e tempo para receber essas respostas, ordenar as candidaturas e fazer eventuais entrevistas. Quais serão, nessa altura, os critérios de seriação dos candidatos, para além da nota de curso e da experiência profissional? A apresentação? Os resultados em anos anteriores? A avaliação dos pais? E quem vai controlar a transparência desses concursos públicos?
sábado, junho 03, 2006
Linhas editoriais avulsas para novos bloggers
1. Escrever posts sempre com menos de dez linhas, a pensar nos leitores de blogs.
2. Fazer de cada post um tratado que poderia ser publicado em livro.
3. Incluir fotografias de divas descascadas, para aumentar as audiências.
4. Escrever só textos próprios, que talvez um dia sejam de colunista da imprensa de papel.
5. Não incluir caixas de comentários, para parecer mais inacessível.
6. Incluir caixas de comentários, mas apagar qualquer beliscão ao blog.
7. Ter vinte colaboradores a escrever, cada um, três entradas sobre os cinco temas do dia na comunicação social, para garantir audiências e, assim, ter a ilusão da importância.
8. Escrever sobre futebol, manifestando simpatia por um clube, para, desse modo, ter a simpatia de uma fracção de leitores.
9. Escrever sobre geringonças que são novidades tecnológicas à mistura com descobertas científicas bizarras, mas fazê-lo em inglês.
10. Escrever posts mutantes.
Contribuições dos leitores do AdP:
11. Um blogue de sucesso deverá, inevitavelmente, incluir poemas ou pensamentos estafados e altamente edificantes (do próprio - mas não necessariamente "originais" - ou alheios) sobre o amor, a amizade, a felicidade e outros temas tão bonitos, próprios das pessoas sensíveis. (Margarida)
12 a 67. Seth Godin escreveu, há uns dias, um post com [mais de] 50 ideias para gerar tráfego nos blogues… (Tiago Pinhal) [A minha preferida: "53. (...) write in Chinese".]
68. Um blogue de sucesso deve ter links para os blogs com mais audiência de modo a aparecer nas pesquisas. (Platero)
69. Mesmo que a sua vida sexual seja enfadonha ou inexistente, o blogger de sucesso deverá recorrer à imaginação e alinhavar um texto podre de escaldante, ilustrado, naturalmente, com fotos a preto e branco- a fotografia a preto e branco, como se sabe, torna tudo mais "artístico"... (Graça)
Mais ideias?
2. Fazer de cada post um tratado que poderia ser publicado em livro.
3. Incluir fotografias de divas descascadas, para aumentar as audiências.
4. Escrever só textos próprios, que talvez um dia sejam de colunista da imprensa de papel.
5. Não incluir caixas de comentários, para parecer mais inacessível.
6. Incluir caixas de comentários, mas apagar qualquer beliscão ao blog.
7. Ter vinte colaboradores a escrever, cada um, três entradas sobre os cinco temas do dia na comunicação social, para garantir audiências e, assim, ter a ilusão da importância.
8. Escrever sobre futebol, manifestando simpatia por um clube, para, desse modo, ter a simpatia de uma fracção de leitores.
9. Escrever sobre geringonças que são novidades tecnológicas à mistura com descobertas científicas bizarras, mas fazê-lo em inglês.
10. Escrever posts mutantes.
Contribuições dos leitores do AdP:
11. Um blogue de sucesso deverá, inevitavelmente, incluir poemas ou pensamentos estafados e altamente edificantes (do próprio - mas não necessariamente "originais" - ou alheios) sobre o amor, a amizade, a felicidade e outros temas tão bonitos, próprios das pessoas sensíveis. (Margarida)
12 a 67. Seth Godin escreveu, há uns dias, um post com [mais de] 50 ideias para gerar tráfego nos blogues… (Tiago Pinhal) [A minha preferida: "53. (...) write in Chinese".]
68. Um blogue de sucesso deve ter links para os blogs com mais audiência de modo a aparecer nas pesquisas. (Platero)
69. Mesmo que a sua vida sexual seja enfadonha ou inexistente, o blogger de sucesso deverá recorrer à imaginação e alinhavar um texto podre de escaldante, ilustrado, naturalmente, com fotos a preto e branco- a fotografia a preto e branco, como se sabe, torna tudo mais "artístico"... (Graça)
Mais ideias?
m.
No centro da carruagem, do lado da janela, virado para o sol, vai Mefistófeles. Olha para ela como quem troça pela notícia de mais um suicídio que mais uma família esconde sob outra qualquer causa. Ataque cardíaco, overdose involuntária, pneumonia mal tratada, tanto faz. Não são mortos próximos, mas olharam-na nos olhos e, por isso, sente uma espécie de dever de pensar em como foi o seu fim. Mefistófeles ri-se da sua consideração de que a morte maldita pode atingir todos e de que o dinheiro não traz felicidade. E ri-se do seu pesar.
Propósito inadiável
O que magoa é ver o pobre
timorense esquálido beber
água do pântano,
onde se escoam lixos,
comer poeira
e saudar-me, quando
rodo na estrada,
ocioso.
Tantos e tantos outros,
timorenses esquálidos,
olham-me como se dever fosse
abrir covas,
plantar repasto
de milho, arroz e carne,
encher copos vazios,
de bebedeira e sonho,
que não magoe,
mortifique o ócio,
reanime o tempo.
Fugir é melhor que prometer
esperança em melhores dias.
Fugir é atrasar o discurso limite
travado pelas rodas
da dúvida maníaca.
Eu não prometo nada.
Invoco os montes
feridos pela luz,
mar que me circunda
em Díli terra-tédio e de má gente.
Afino-me pelo timbre
limpo das almas
dos timorenses esquálidos
que me soletram vivo.
E sigo,
limpo na alma e no rosto,
sujeito à condição que me redime.
Os Timorenses só terão razão
quando me matarem.
(Ruy Cinatti)
timorense esquálido beber
água do pântano,
onde se escoam lixos,
comer poeira
e saudar-me, quando
rodo na estrada,
ocioso.
Tantos e tantos outros,
timorenses esquálidos,
olham-me como se dever fosse
abrir covas,
plantar repasto
de milho, arroz e carne,
encher copos vazios,
de bebedeira e sonho,
que não magoe,
mortifique o ócio,
reanime o tempo.
Fugir é melhor que prometer
esperança em melhores dias.
Fugir é atrasar o discurso limite
travado pelas rodas
da dúvida maníaca.
Eu não prometo nada.
Invoco os montes
feridos pela luz,
mar que me circunda
em Díli terra-tédio e de má gente.
Afino-me pelo timbre
limpo das almas
dos timorenses esquálidos
que me soletram vivo.
E sigo,
limpo na alma e no rosto,
sujeito à condição que me redime.
Os Timorenses só terão razão
quando me matarem.
(Ruy Cinatti)
Timor-Leste: perplexidade
1. Uma constituição deve ser feita à medida dos protagonistas da altura, claro...
2. A Igreja timorense precisa de ser "envolvida" na construção da democracia timorense, não o pode fazer de motu proprio. Até, porque, entre um governo de Alkatiri e a anarquia, a escolha é...
3. Serão os GNR a prender o senhor Alfredo Reinado?
2. A Igreja timorense precisa de ser "envolvida" na construção da democracia timorense, não o pode fazer de motu proprio. Até, porque, entre um governo de Alkatiri e a anarquia, a escolha é...
3. Serão os GNR a prender o senhor Alfredo Reinado?
sexta-feira, junho 02, 2006
Timor-Leste: história de um país sem partido único, mas quase
(...) Companheiros da Luta [timorenses na diáspora],
O divisionismo, incentivado pelos caminhos ideológicos diversos e/ou opostos, levou os timorenses a considerarem-se inimigos, actuando em defesa das suas políticas. Ainda hoje, alguns tentam justificar essas acções para minimizar as culpas ou para afirmar que são inocentes. Creio que, exclusivamente pelos superiores interesses do nosso Povo, devemos apenas lembrar os factos que assinalaram a nossa história, como exercício mental para daí extrair lições, com o propósito de não contribuir, agora e no futuro, para que se faça sofrer o nosso Povo.
Se a violência fora a escolha preferida pelos dirigentes timorenses, a existência de um braço armado na dependência de um Partido, constituiria sempre um factor de interposição na reconstrução de uma unidade sem reservas. Para além disto, o próprio desenvolvimento da Luta retirava os funcionários político-ideológicos das FALINTIL, fazendo-as assumir uma missão mais nobre - a defesa da Pátria! Foi esta a razão do apartidarismo das FALINTIL.
E se, como membro do CCF [Comité Central da FRETILIN], eu assumia até então a responsabilidade pela condução do processo, como Comandante das Falintil e no espírito da CNT [Convergência Nacionalista Timorense], eu pensava estar em condições políticas para não me subordinar a nenhum partido, respeitando-os a todos. Se aos partidos pertenceu a ideologia da libertação da Pátria, às Forças Armadas o papel de praticar essa ideologia na defesa da Pátria, para a sua libertação. Foi assim que nasceu a estrutura do CNRM [Conselho Nacional da Resistência Maubere], que concederia à CNT uma maior dimensão política. (...)
Kay Rala Xanana Gusmão
Cmdt. das FALINTIL
Quartel-General do Conselho Nacional da Resistência Maubere,
em 1 de Maio de 1992
in Xanana Gusmão, "Timor Leste - Um Povo, uma Pátria", Edições Colibri, 1994
O divisionismo, incentivado pelos caminhos ideológicos diversos e/ou opostos, levou os timorenses a considerarem-se inimigos, actuando em defesa das suas políticas. Ainda hoje, alguns tentam justificar essas acções para minimizar as culpas ou para afirmar que são inocentes. Creio que, exclusivamente pelos superiores interesses do nosso Povo, devemos apenas lembrar os factos que assinalaram a nossa história, como exercício mental para daí extrair lições, com o propósito de não contribuir, agora e no futuro, para que se faça sofrer o nosso Povo.
Se a violência fora a escolha preferida pelos dirigentes timorenses, a existência de um braço armado na dependência de um Partido, constituiria sempre um factor de interposição na reconstrução de uma unidade sem reservas. Para além disto, o próprio desenvolvimento da Luta retirava os funcionários político-ideológicos das FALINTIL, fazendo-as assumir uma missão mais nobre - a defesa da Pátria! Foi esta a razão do apartidarismo das FALINTIL.
E se, como membro do CCF [Comité Central da FRETILIN], eu assumia até então a responsabilidade pela condução do processo, como Comandante das Falintil e no espírito da CNT [Convergência Nacionalista Timorense], eu pensava estar em condições políticas para não me subordinar a nenhum partido, respeitando-os a todos. Se aos partidos pertenceu a ideologia da libertação da Pátria, às Forças Armadas o papel de praticar essa ideologia na defesa da Pátria, para a sua libertação. Foi assim que nasceu a estrutura do CNRM [Conselho Nacional da Resistência Maubere], que concederia à CNT uma maior dimensão política. (...)
Kay Rala Xanana Gusmão
Cmdt. das FALINTIL
Quartel-General do Conselho Nacional da Resistência Maubere,
em 1 de Maio de 1992
in Xanana Gusmão, "Timor Leste - Um Povo, uma Pátria", Edições Colibri, 1994
quinta-feira, junho 01, 2006
Jacarandás
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