sexta-feira, outubro 22, 2004

Rajada

"Trinta horas depois da morte do sargento Faustino Rivera, Irene foi baleada à porta da editora. Saía do trabalho, já tarde, quando um automóvel estacionado no passeio em frente pôs o motor em marcha, acelerou e passou a seu lado como um vento fatídico, disparando uma rajada de metralhadora antes de se perder no trânsito. Irene sentiu um golpe terrível no coração e não percebeu o que tinha acontecido. Desmaiou sem um grito. Toda a sua alma ficou como que vazia e a dor paralizou-a. Teve um instante de lucidez, durante o qual conseguiu sentir o sangue crescendo à sua volta, num charco incontrolável, e logo de seguida mergulhou no sono.

"O porteiro e outras testemunhas do facto também foram apanhados desprevenidos. Ouviram os disparos e não souberam identificá-los, pensaram numa explosão de motor ou na passagem de um avião, mas quando a viram cair correram para socorrê-la. Dez minutos mais tarde, Irene era levada numa ambulância com as sirenes ligadas e as luzes acesas. Tinha inúmeras perfurações de bala no ventre, por onde lhe fugia a vida aos borbotões."


(in "De Amor e de Sombra", Isabel Allende, Difel)

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