sábado, abril 01, 2006

Com os joelhos submersos

Embora completamente submersa, a baleeira estava quase intacta. Nadando em volta, recuperámos os remos e, transpondo a borda, retomámos os nossos lugares. Ficámos ali sentados, com os joelhos submersos, pois a água cobria toda a embarcação, de tal modo que esta parecia, aos nossos olhos arregalados, um banco de coral que subia do fundo do oceano para nos recolher.

O vento agora uivava e as vagas começavam a entrechocar-se; a borrasca rugia, saltava e estalava à nossa volta como um incêndio na pradaria, um incêndio em que ardíamos sem nos consumirmos, imortais nas próprias fauces da morte! Em vão gritávamos para as outras embarcações. Mas de nada servia gritar no meio daquele temporal. Entretanto, as nuvens à desfilada, a espuma e o nevoeiro tornavam-se ainda mais negros com a noite que caía; não se avistava o menor sinal do navio. O mar frustrava todas as tentativas que fazíamos para baldear a nossa baleeira. Os remos inúteis eram agora meros meios de salvação. Starbuck, cortando o fio do saco impermeável onde se encontravam os fósforos, conseguiu acender a lâmpada da lanterna; depois, colocando-a na ponta do mastro partido, estendeu-o a Queequeg que se tornou o porta-bandeira da nossa derradeira esperança erguendo aquele farol insensato no cerne do nosso desespero. E ali ficou ele, como o símbolo de um homem sem fé, erguendo uma esperança desesperada no seio do desespero.


(Herman Melville)

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