Dias depois, ela dirigiu-se-lhe, oferecendo-se para lhe pagar um corte de barba e cabelo no barbeiro da rua e um fato novo. Foram os dois até casa dela, onde ele tomou um banho e vestiu o fato, envergonhado. Foi sempre ela que falou, e falou-lhe, a sorrir, na "vidinha de pequena-burguesa" que levava. Ele manteve-se calado. Tomou o pequeno-almoço. Ela quis ir com ele à Segurança Social ou ao Centro de Emprego. Então, ele disse, em voz baixa, que já estava inscrito. Olharam-se nos olhos. Ela ganhou coragem e perguntou-lhe como tinha acabado assim. E ele contou que tinha ficado viúvo e que perdera o interesse pelo trabalho, pelas refeições, pela higiene e, finalmente, pela vida. Perdera o emprego e, pouco a pouco, tudo o resto. Afogou as mágoas em todas as formas de álcool.
Quis morrer. Mas não é fácil, a morte. Podia facilmente comprar uma corda, mas onde é que se encontra onde enlaçá-la? E como chegar lá? Um dia, foi a uma loja de produtos para a agricultura pedir 605 Forte, mas a senhora que o atendeu olhou para ele e, clarividente, mandou-o embora.
Ela propôs-lhe que procurassem um trabalho para ele. Iriam responder a anúncios, percorrer ruas e lojas, inscrever-se em empresas intermediárias, até encontrar alguma coisa. E encontraram. Um trabalho pouco qualificado, mas que lhe permitiu pagar um quarto numa pensão. Seis meses depois, encontrou um emprego melhor.
Nunca mais se viram. Aliás, nem chegaram a saber o nome um do outro.
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