O direito humano em caso algum pode fundar-se sobre outra coisa que não seja o direito de natureza. E o grande princípio, o princípio universal de um e do outro, é, em todos os pontos da terra: «Não faças o que não quererias que te fizessem». Ora, não se vê como, seguindo este princípio, um homem pode dizer a outro: «Crê naquilo em que eu creio e em que não podes crer, ou morrerás.» É o que se diz em Portugal, em Espanha e em Goa. Outros países há em que presentemente as gentes se contentam em dizer: «Crê ou abominar-te-ei; crê ou far-te-ei todo o mal possível; monstro, não tens a minha religião, não tens, portanto, religião alguma: terás que suscitar o horror dos teus vizinhos, da tua cidade, da tua província.» O direito de intolerância é, pois, absurdo e bárbaro: é o direito dos tigres, e é bem horrível; porque os tigres matam para comer e nós andámos a exterminar-nos por causa de parágrafos.
Voltaire, Tratado sobre a tolerância (Antígona, 1999)
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