A um canto, a lagartixa, o lagarto e o crocodilo palestravam em família. Cousa digna da atenção do filósofo é que a lagartixa via no crocodilo uma formidável lagartixa, e o crocodilo achava a lagartixa um crocodilo mimoso; ambos estavam de acordo em considerar o lagarto um ambicioso sem gênio (versão lagartixa) e um presumido sem graça (versão crocodilo).
— Quando lhe perguntaram pelos avós, observou o crocodilo, costuma responder que eles foram os mais belos crocodilos do mundo, o que pode provar com papiros antiquíssimos e autênticos...
Tendo nascido, concluiu a lagartixa, tendo nascido na mais humilde fenda de parede, como eu... Crocodilo de bobagem!
— Notai que ele fala muito do loto e do nenúfar, refere casos do hipopótamo, para enganar os outros, confunde Cleópatra com o Khediva, e as antigas dinastias com o governo inglês...
Tudo isso era dito sem que o lagarto fizesse caso. Ao contrário, parecia rir, e costeava a parede da arca, a ver se achava algum calor de sol.
(Machado de Assis, A semana)
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